sábado, 17 de agosto de 2013

Sobre o não entendimento do que é ser criança

Ontem, num momento de conversa aqui no trabalho, conversávamos sobre por que as crianças precisam de um "empurrãozinho" para brincar. Isso porque eu estava dizendo que precisei ensinar meus filhos a fazer cabaninha no beliche e criei, lá dentro, um super laboratório secreto que, para entrar e provar que era cientista de verdade (isso foi o Igor que adicionou), tinha de ultrapassar a barreira da entrada lateral. Claro que meus três pequenos se mostraram ótimos cientistas e eficientes puladores de janelinha de beliche. :)
Voltando... Se eu não tivesse incentivado, acredito que eles não teriam ficado uma hora inteirinha dedicados à brincadeira do laboratório que, claro, a partir dali foi totalmente criada por eles. O assunto daqui do trabalho era justamente a impressão de que não precisávamos de empurrãozinho quando crianças. Em geral, poucos adultos na minha época davam esses incentivos, com exceção da minha mãe, chamada por muitos da família de "Xuxa" (eca, ela é bem melhor que a Xuxa!) e da minha tia, que também chamo de "mamãe".
Comentei que talvez hoje houvesse muitos brinquedos, todos prontinhos e perfeitos. Um outro colega falou sobre a condição de morar em apartamento. Outra, ainda, sobre a dificuldade de se enturmar com os vizinhos, brincando na rua, em que uma criança é que ensina a brincadeira para a outra.
Cheguei à conclusão de que a vida urbana causa muita dificuldade à liberdade da criança. Afinal, apenas no Brasil são 84,4% da população vivendo em cidades, de acordo com o Censo 2010. A visão consumista do mundo também, pois há muitos carros nas ruas (tornando-as perigosas), muitos brinquedos, muitos jogos eletrônicos, muita TV, muito tanta coisa que não sobra espaço para a criança pensar por si, criar por si.
Agora, o motivo mais decisivo para mim é a falta de respeito com a criança. Não perguntamos o que ela quer de verdade. Empurramos um monte de enlatados, criamos os desejos nela e nos satisfazemos quando ela responde que quer determinado item. Fora isso, não a deixamos correr, pular, gritar. Todas as vezes que preciso pedir para o Caio não pular, porque senão o vizinho debaixo vai reclamar, dentro de mim grita desesperadamente: "preciso morar numa casa!".
E olha que essa contenção que faço é fichinha frente a outra maior que nossa sociedade está fazendo, etiquetando as crianças com transtornos mil (conforme essa entrevista, o Brasil é o segundo maior consumidor de remédios contra TDA-H)... Li um texto que traz algumas das atitudes infantis que seriam sintomas do Transtorno do Déficit de Atenção (TDA com ou sem H, ou seja, hiperatividade), de acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DMS):
• Com frequência parece não escutar quando lhe dirigem a palavra;
• É facilmente distraído por estímulos alheios à tarefa;
• Com frequência apresenta esquecimento em atividades diárias;
• Frequentemente abandona sua cadeira em sala de aula ou outras situações nas quais se espera que permaneça sentado;
• Frequentemente agita as mãos ou os pés ou se remexe na cadeira;
• Frequentemente corre ou escala em demasia, em situações nas quais isso é inapropriado;
• Frequentemente fala em demasia;
• Frequentemente tem dificuldade para brincar ou se envolver silenciosamente em atividades de lazer;
• Frequentemente dá respostas precipitadas antes de as perguntas terem sido completadas;
• Com frequência tem dificuldade para aguardar sua vez.
Não entrando no mérito se a doença existe ou não (eu acredito que ela seja desencadeada por n fatores, ou seja, uma criança não É TDA-H, ela ESTÁ com TDA-H, mas aí eu precisaria defender um mestrado aqui, o que não é o caso...), mas só esses itens aí são tão esquisitos. A Alexandra, no texto que linkei acima, faz o contraponto de cada um muito bem, você precisa ler. E eu fico imaginando essa criança, doida para desbravar o mundo e sendo constantemente contida e contida e contida.
De fato, nós não enxergamos as crianças. Nós queremos pura e simplesmente o nosso bem-estar, do adulto, como pode ser muito melhor refletido com a ajuda deste texto aqui e deste outro.

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