quarta-feira, 24 de julho de 2013

Os depósitos de crianças

Esses dias li um texto que leva a uma interessante reflexão. O autor fala sobre as escolhas que os pais da classe média alta fazem com relação às crianças e conclui o texto com algumas perguntas:
[...] quando foi que passamos a odiar nossas crianças? Continuaremos a deixá-las de lado ao invés de integrá-las de fato em nossa sociedade?
Eu estava pensando justamente sobre essa questão semana passada. Ampliando um pouco mais e considerando todas as classes sociais, decididamente a nossa sociedade ainda não está preparada para acolher as crianças. Talvez o lugar das crianças seja mesmo ao lado dos adultos, durante o trabalho até (leu o texto de ontem?), mas como se muito dos trabalhos atualmente exigem período integral de dedicação e geralmente limitam-se a digitar, ler, arquivar...
Como poderíamos transformar as atividades de forma que não nos tomasse todo o tempo e as crianças pudessem estar sempre conosco?
Que atividades teríamos de desenvolver para ter as crianças por perto ou, ainda, que divisões de trabalho precisariam ser feitas para que toda a sociedade se responsabilizasse pelas crianças e elas não ficassem nos depósitos a que muitas vezes se resumem as escolas?
Sobre a primeira pergunta: "quando foi que passamos a odiar nossas crianças?", eu diria que os adultos são crianças pouco amadas, pouco tocadas e precisam curar essa ferida para poder dar às crianças, hoje, o que não tiveram no passado. E, claro, se reconhecer no papel de adulto, com experiências e possibilidades de reflexão que a criança ainda não é capaz.
Por que ficamos tão bravos se a criança não atende ao nosso pedido? Por que limitamos a relação pais-e-filhos à autoridade/autoritarismo? Por que não paramos para, verdadeiramente, ouvir as crianças?
Eu tenho tentado praticar esse exercício (pois é... não é fácil tentar se tornar um adulto melhor e mais consciente... rs...) de ouvir meus pimpolhos. Se eles pedem algo que, a princípio, me parece fora de propósito, procuro entender o contexto e o que os teriam levado a fazer determinado pedido. Em geral eu descubro o x da questão e aquilo me parece tão óbvio que não há como negar. :) Não estou dizendo que não devemos falar "não" para as crianças (se bem que há teorias que são a favor de não dizer essa palavrinha), mas quando falarmos o "não" termos claro, para nós, o porquê daquela negativa.

5 comentários:

  1. Esse texto me lembrou muito os do dr. José Martins Filho, apesar de muito mais exagerado. Já te indiquei a leitura dos livros dele várias vezes, lembra? Ele fala sobre a questão da criança terceirizada.

    Quando li os livros dele, concordei com quase tudo. Ele quase implora para os pais não colocarem as crianças antes dos 2 anos na escola, mas sei que isso não é para qualquer família. E mesmo quando um dos pais pode ficar em casa com a criança, nem sempre a pessoa tem a capacidade de passar o dia inteirinho sem ficar maluca (meu caso). Ele diz que, nesses casos, provavelmente a mãe não nasceu para ser mãe. Mas será mesmo que eu não deveria ter tido uma filha só porque esse trabalho de 24h por dia me cansar de vez em quando? Sério mesmo?

    (continua)

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  2. (continuando)
    Não acho que a nossa sociedade odeie as crianças. Será mesmo que precisamos deixar todo o resto para focar 100% do tempo nas crianças para provar que a amamos? Como eu já falei ali em cima, me sinto sufocada por ficar constantemente com a minha filha. Preciso dar uma escapada de vez em quando e não acho que eu tenho que ter uma super justificativa. Se eu quiser só sair para comer um pão de queijo com a minha amiga (programa de amanhã!) enquanto minha filha fica com o pai (ou, se ele não pudesse ficar com ela, que fosse com outra pessoa ou até uma escola) não me torna uma má mãe. Ao contrário, me acalma e me faz ter mais ânimo de ficar com ela.

    E outra coisa: nunca fiz isso, mas se eu for num shopping e quiser fazer uma refeição tranquila (sempre como com ela, com pressa e sem prestar atenção no que como - definitivamente não são "momentos de paz", como diz o autor), pagar para um desses locais que ficam com a criança durante meia hora seria mesmo tão desumano??
    Ok, existem pessoas que parecem não se importar com os filhos. Mas certamente não é toda a sociedade ou qualquer pai de criança que esteja na escola.

    Sobre a questão do não, conheço mães que só falam não quando a criança está em situação de vida ou morte. Não sou assim e digo não com firmeza, mas para coisas que realmente importam para mim, e não por uma questão de autoridade ou de dizer não para a criança se acostumar com proibições.

    Ufa, acabei! hahaha

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    1. Lia, não acho que alguém que é mãe não nasceu para ser mãe. Pelo simples fato de que ela É mãe. Entretanto, como falei no texto, a nossa sociedade não inclui as crianças. Por isso você sente o peso todo nas suas costas. Você tem de decidir com quem deixar a pequetita, você tem de estar totalmente disponível mesmo se estiver gripada ou indisposta. Acho isso desumano! A sociedade, como una, tinha de assumir as crianças integradas a ela e não apartadas nas escolas, nos nichos infantis etc. Por que é ruim comer com as crianças no shopping? Ora, porque shopping não é lugar de criança! Agora, imagina se o shopping tivesse uma área aberta justamente na praça de alimentação e que os pais se revesassem naturalmente para olhar as crianças enquanto os outros pais comessem e conversassem tranquilamente? O que eu quero dizer é que o princípio está equivocado. Elas já são excluídas de antemão.
      E não, Lia, você não é uma má mãe por querer sair com uma amiga sem sua pimpolha. :) Nunca, nunquinha! Como a sociedade está, como as coisas estão organizadas, é o mínimo que a gente pode fazer para manter a sanidade mental.
      Adorei seu comentário com tanta reflexão!! Obrigada pela lição.

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    2. Agora entendi seu ponto de vista, Pê. Você está se referindo às comunidades colaborativas, né? Aí, sim, acho que faz sentido.

      É que eu não fiquei muito fã do texto referência (aliás, eu quis dizer que ele está exagerado, e não o seu, tá?) porque o autor está criticando os pais por deixarem seus filhos de lado, mesmo que só algumas vezes. Quando uma mãe disse coisas parecidas com as que eu disse aqui, ele respondeu "o foco do post [... é] sobre uma parcela razoavelmente grande que tenho o desprazer de observar se desvencilhando de suas crianças para fazerem outras coisas". Ele também criticou os programas de férias, não propondo que a sociedade deveria assumir a responsabilidade pelas crianças, mas condenando os pais por quererem "se livrar dos filhos". Lembro como minhas férias eram chatas porque minha mãe trabalhava e eu ficava o dia inteiro vendo TV no nosso apartamento. Muito melhor se eu pudesse participar de alguma dessas oficinas.
      Deixa esse cara se tornar pai e sentir na pele a exaustão de cuidar de crianças, e vamos ver se ele nunca vai apelar para "animadores de crianças".

      Para finalizar, ainda acho que nossa sociedade não odeia as crianças (deu pra perceber que o texto me incomodou?? haha). O que acho é que vivemos em uma sociedade individualista. Minha avó, por exemplo, mora no bairro aqui do lado, mas me pergunte se alguma vez ela se propos a me ajudar com a Nicole, ou sequer nos convidou para uma visita nesse um ano que moramos aqui. NUNQUINHA. E sabe o motivo? Porque ela gosta da rotina dela e da casa organizada. Fico magoada, mas não acho que ela aja assim porque não gosta da Nicole. É porque ela consegue ser bem egoísta mesmo.

      Eu que agradeço por levantar essas questões tão interessantes, Pê. Acordei, fiquei pensando no que vc escreveu e até perdi o sono de tanto que a cabeça começou a funcionar. haha

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    3. Na verdade, Lia, meu sonho é mais platônico. Eu não acho que precise de comunidades colaborativas para incluirmos as crianças. Devíamos, como sociedade, incluí-las desde já, desde hoje. Infelizmente não é isso que vemos! Há movimentos que estão caminhando para isso (veja o Cinematerna, por exemplo), mas ainda são passinhos de formiguinha...
      Quanto ao texto, eu também não aprovei 100% do que o moço disse. E também não acho "odiar" o verbo mais adequado. Eu apenas acho que não as incluímos e aí fica difícil para os próprios pais e mães incluirem-nas também.
      Nem todo texto ou vídeo que indico aqui concordo 100% (na verdade, poucas coisas nessa vida concordo 100%. Sou meio marrenta! rs...).

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